A palavra sal foi-nos deixada pelos latinos (“sal, salis”), que tanto a empregavam para designar o produto material extraído, por evaporação, da água do mar, como para aludir, em sentido figurado, à vivacidade, à finura cáustica, ao espírito picante, ao bom gosto, à inteligência. E foi assim, com estes dois sentidos, que o sal entrou na nossa linguagem quotidiana, da menos à mais erudita.
Salada, no feminino é um prato de vegetais em cujo tempero entra o sal, mas no masculino, salado, significa salgado, do mesmo modo que salão é terreno salgadiço, salgadio ou salino. Salário, já o dissemos, foi ração de sal e é hoje significado de remuneração. Salé é carne salgada e saleiro tanto é o recipiente onde se guarda o sal, com o qual salpresamos ou salpicamos os alimentos no prato, como é o homem que vende sal ou o que o produz, isto é o salineiro ou marnoto. Mas saleira é o barco de fundo chato, do Vouga, que transporta o produto do seu trabalho. Salga é o acto de salgar, que o que os nossos pais faziam aos toucinhos e outras carnes, após a matança do porco, e às sardinhas que acomodavam em barricas para abastecer as populações do interior. Salgadinhos, comemo-los como aperitivos ou fazem o almoço frugal de muitos e salganhada ou salmonada é a falta de arrumo, é confusão. Salgados são as terras baixas, alagadiças invadidas por águas cuja salinidade ou salugem as torna salgadiças, sendo nestas baixas que, preferencialmente, se instala a salicultura ou salicicultura. Salicáceas são as plantas de uma família botânica, salicórnia é o nome vulgar de uma delas e salinómetro é o aparelho que mede o teor de sal. Salícula ou salífero é o terreno que produz sal. Salmoura é água mais ou menos saturada de sal, como a que conserva o atum e salmoeira, a vasilha. É ainda a água salgada que percorre o pipeline de Matacães até à Póvoa de Santa Iria, e salmurdo é sinónimo de sonso ou matreiro. Salobra ou salmaça diz-se da água mais ou menos contaminada com sal. Salsa, como adjectivo, é o mesmo que salgada; como substantivo é a erva que usamos como tempero de muitas confecções culinárias, mas é também sinónimo de molho. E, para terminar, salsicha e salpicão são nomes de enchidos temperados com sal.
Tal não aconteceu com “halós” a palavra dos gregos sinónima de sal. A passagem deste povo pela península, muito anterior à dos romanos, não teve nem a duração nem a importância da ocupação romana. Apenas no jargão científico e tecnológico dispomos de vocábulos construídos com base neste outro étimo. Diz-se que um solo é halomórfico quando salgado, que um organismo é halofílico quando suporta bem a presença de sal e dá-se o nome de halófitas às plantas desse conjunto. Chama-se halite ao sal-gema, halogenetos aos minerais salinos e haloquinese à deformação tectónica induzida pela presença de rochas salinas no seio das sequências afectadas. Hiper-halino, hipo-halino, termo-halino, euri-halinos, esteno-halinos, etc., são mais alguns desses termos, nestes casos usados em oceanografia.
Para os químicos, o sal é um composto resultante da interacção de um ácido com uma base, como, por exemplo, a do ácido clorídrico com a soda cáustica,
HCl+Na(OH)→NaCl+H2O
ou da acção de um ácido sobre um metal, exemplificada pela reacção do mesmo ácido sobre o estanho,
2HCl+Sn→SnCl2+H2↑
Cloretos, sulfatos, brometos, iodetos, carbonatos, fosfatos, etc. são sais. Porém, todos eles necessitam de um qualificativo que os distinga dos restantes.
Sal amargo ou sal de Epson – cloreto de magnésio
Sal de Bertholet – clorato de potássio
Sal de Fischer – cobaltonitrito de potássio
Sal de Glasser – sulfato de potássio
Sal de Glauber – sulfato de sódio
Sal de la Hiquerra – sulfato de magnésio
Sal de la Rochelle – tartarato de sódio e potássio
Sal de Vichy – bicarbonato de sódio.
Só o cloreto de sódio dispensa esse cuidado. Basta-lhe a palavra sal dita ou escrita isoladamente
A.M. Galopim de Carvalho
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva