A Misericórdia de Constância está a proceder a uma intervenção na igreja da Irmandade. A requalificação de cerca de 200.000,00€ consiste numa intervenção na cobertura e no restauro interior da talha e dos altares. A obra de requalificação da Igreja é apoiada pelo Fundo Rainha Dona Leonor (fundo que apoia projectos das misericórdias portuguesas) na ordem dos 75 a 80%, sendo que a Câmara comparticipa a parte não elegível.
Em Dezembro passado por proposta da CDU a assembleia municipal aprovou uma recomendação para a comparticipação na parte não financiada, tendo a proposta passado mas com os votos da CDU. O PS absteve-se e promoveu até votos contra. E isto seguindo de perto o relato do líder da bancada da CDU na página da internet oficial daquela força política.

A Igreja da Misericórdia foi classificada pelo Estado português como de «interesse público» segundo o artigo 2º do Decreto-lei nº 95/78, de 12 de Setembro. Segundo os documentos da Irmandade existentes no arquivo distrital já se podia ali enterrar os mortos no final do século XVI (em1590?) Quanto à sagração do templo foi tema de querela levado à jurisdição de Abrantes dadas as dúvidas existentes então.
É curioso o facto de ter sido descoberto recentemente um forno de cerâmica nas traseiras da igreja, por ocasião da dita requalificação das obras do largo Cabral Moncada. O município contratou um arqueólogo para acompanhar a obra mas só após diversas insistências que promovi no grupo “Amigos de Constância” das redes sociais .
Descoberto o forno cuja origem os técnicos admitiram poder remontar ao século XVII,, logo o soterraram. Nem sequer providenciaram uma solução com cobertura em vidro, iluminada ,como se vê em várias localidades que valorizam os vestígios arqueológicos .
Cabia à edilidade a iniciativa. O conjunto e o pormenor do painel degradado do altar-mor da Igreja da Irmandade, de inspiração renascentista, pintado inicialmente de verde e amarelo, é de Domingos Vieira Serrão, pintor de Filipe I I que tem obra no Convento de Cristo e no Louvre.
A Igreja, estando em zona inundável, foi alvo constante de cheias, sendo de assinalar as de maior quota, a saber, na década de setenta, quer do século XIX, quer do século XX. 1978 e 1979 provocaram imensos prejuízos no templo.
Durante o Estado Novo a igreja beneficiou de algumas intervenções pontuais em particular no coro alto mas sabe-se que esteve encerrada bastava tempo. Nos anos 80 já tinha havido uma obra de recuperação da sacristia, do tecto e do interior do trono, parte de trás, era Provedor o sr. Aurélio Nogueira. Na década seguinte, era Provedor António da Silva Teixeira, pai do actual Provedor (e presidia eu à assembleia geral), fez-se uma candidatura a fundos europeus para restauro do altar-mor, não tendo o projecto sido elegível, o que muito nos desolou.



O município de Constância nunca demonstrou especial interesse na recuperação deste património colectivo. Em 1997, era Provedor João Carlos Pereira, e foram restaurados os quadros da Via Sacra, pela mão do pintor Fernando Santos o qual tinha sido agraciado pelo Papa João Paulo II, mais o irmão, Joaquim Santos, pelo restauro da matriz, trabalho que acompanhei em 1978 e 1979. Estes artistas eram filhos do pintor Marron (Carlos Henriques dos Santos) o qual foi discípulo de Malhoa e Columbano (estes dois com obra na vila) .
Voltando ao município, posso dizer que de 1987 a 2008 não me recordo da câmara ter apoiado a recuperação da igreja, salvo alguma questão menor que me esteja a escapar. Mas o quê? Sendo uma das suas atribuições legais o apoio de imóveis e de pessoas de interesse público (Lei 75/2013, na sua versão actual), não lhe ficava mal mais cooperação no âmbito da defesa do património e da cultura. É o que se espera dos autarcas pois apenas são gestores da coisa pública e bem pagos.
Um caso!
É lamentável que a actual força municipal maioritária tenha bloqueado uma proposta da Santa Casa, quando eram força minoritária, em que a Irmandade propôs por exemplo a salvaguarda de património arquivístico, muito relevante e raro sobre o Concelho.



Quem exerce o poder público não deve seleccionar o calendário político mais propício para dar apoios.
A Dr.a Manuela de Azevedo, jornalista e então presidente da Associação da Casa de Camões, a Doutora Manuela Mendonça, presidente da Academia Portuguesa de História e eu próprio, o antigo Provedor Vasco Botelho de Souza, todos procurámos a defesa do património arquivístico a que atrás me refiro. A proposta de protocolo foi aprovada pela assembleia geral a que eu presidia. Mas o PS, na câmara, com os seus jogos de bastidores fez abortar os contactos que então tínhamos desenvolvido com o executivo, acaso da CDU.
O espólio da Santa Casa desde o início do século XVI foi entregue sob protocolo ao Arquivo Distrital Mas a Irmandade tem um outro acervo notável de livros de actas, de assentos, de receitas e despesas, de testamentos, de escrituras, etc, desde os anos 70 do século XVI. Esse espólio foi “descoberto” por mim e está inventariado pela Doutora Manuela Mendonça. Perguntam: por que motivo não foi inventariado nos anos 70 quando a Doutora Maria Clara Pereira da Costa, então Conservadora da Torre do Tombo, fez o inventário com a Santa Casa e tudo foi entregue no Arquivo Distrital? Porque nunca o tinham visto. Esse espólio estava no sótão duma casa doada à Irmandade por Manuel Campas. Foi o Sr. Aurélio Nogueira antigo Provedor que mo mostrou. É um verdadeiro tesouro. Quando essa casa foi arrendada ao escritor Serras Pereira, o espólio foi transferido para a sede. Só no mandato de Vasco Botelho de Souza é que eu pude analisar o que estava ali. É notável! Este acervo contém dados civis, económicos e religiosos sobre Constância ( então Punhete) inéditos.
Quando propus à assembleia geral um protocolo com o município, já tinha acordado com a vereadora da cultura a possível cooperação entre instituições. Tudo com o acordo da Mesa Administrativa. Fez-se o orçamento para a transcrição dos documentos essenciais. Mas tudo abortou na câmara, dadas as críticas do PS.
Quem ama Constância de verdade, olha primeiro para o interesse público.



Nos últimos quatro anos várias vezes tenho alertado para a urgência da recuperação da Igreja da Irmandade. na linha do que sempre fiz. Nunca é demais recordar que o actual Provedor integrou os corpos gerentes no mandato em que nos anos 90 tentámos, sob iniciativa do seu pai, o antigo Provedor António da Silva Teixeira, levar a bom porto uma candidatura oficial de recuperação do altar-mor.
À Mesa Administrativa só posso desejar sucesso nos projectos que estão a desenvolver neste âmbito.
Não sei quem é o técnico que acompanha o restauro das pinturas de Domingos Vieira Serrão, pintor de Filipe I. Parece-me uma empresa hercúlea. Haverá forma de encontrar vestígios da pintura? Deus queira. Sobre a questão da talha, discuti o assunto com o saudoso pintor Joaquim Santos, do Oficialato da Ordem do Infante Dom Henriques. Ele achava que a talha esteve pintada já não sei se de branco ou de azul?
José Luz
(Constância)
PS- não uso o dito AOLP