Domingo, Maio 28, 2023
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Juiz de fora e juiz de dentro

A notícia de que juízes do Porto pediram escusa de intervir num processo ligado aos negócios de futebol e dos seus agentes, que no caso incluíam o presidente do principal clube da cidade, Pinto da Costa e vários dos dirigentes da Sociedade Anónima Desportiva e empresários de jogadores é preocupante e reveladora.
Preocupante porque revela que no Porto existe um poder subterrâneo, marginal e fora da lei. Não existe pleno exercício da soberania naquela comarca. Pelo menos os juízes foram corrompidos por um poder marginal. Se foram corrompidos se se deixaram corromper é outra questão. Se confessam a corrupção ou não, a realidade é que estão corrompidos. Inaptos para a função.
O motivo do pedido de escusa dadas as relações de convívio e amizade com os dirigentes da Sociedade Anónima sob investigação é reveladora do caráter dos juízes em causa e da sua desadequação à função e também ao ambiente de complacência com os princípios que leva estes atos a serem tidos como normais. O juiz, como os todos os magistrados, tem deveres de recato, de prudência. Os magistrados estão (ou devem estar) inibidos de certos comportamentos que ponham em risco a sua imparcialidade e isenção e até a “imagem” que transmite segurança (por isso usam um uniforme nos tribunais e têm direito a tratamento codificado).
O bom senso deveria ser suficiente para os magistrados se absterem de certas convivialidades e atitudes, mas não é. Estes juízes provam que não é. Por terem o dever de recato, de limitação de direitos, os juízes são dos mais bem remunerados funcionários do Estado e têm direitos e privilégios que os distinguem dos cidadãos comuns.
Lembro-me de, enquanto aluno no Colégio Nun’ Alvares em Tomar, ter tido um colega de que apenas recordo o nome de família, Roupiço, de que não mais tive notícias, filho do juiz da comarca. Sei que o pai peregrinava pelo país, estando 4 ou 5 anos em cada localidade, precisamente para não criar afetos locais. Viviam numa modesta casa de função e o pai, o juiz, não frequentava o Café mais conhecido da cidade, por ali se reunirem os advogados.
O juiz Roupiço era o que se designava o herdeiro da figura do juiz de fora, na Europa e desde a Idade Média, um magistrado nomeado pelo Rei para atuar em concelhos onde era necessária a intervenção de um juiz isento e imparcial.
Os juízes do Porto, pertencem à nova categoria do juiz de dentro e a bem da justiça deviam passar à categoria de juízes de fora do sistema judicial, que pagamos caríssimo, em custos diretos e indiretos, entre estes a descredibilização do Estado de Direito. E então, fora do sistema judicial, estes juízes poderiam frequentar os amigos e as amigas que entendessem, assistir a espetáculos e galas para que as empresas os convidassem, sem necessidade de escusas.

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Carlos Matos Gomes
Carlos Matos Gomes
Carlos de Matos Gomes nasceu em Vila Nova da Barquinha, em 1946. Coronel do Exército em situação de reforma, cumpriu três comissões na guerra colonial (Moçambique, Angola e Guiné), nas tropas especiais «comandos». Fez parte da primeira comissão coordenadora do Movimento dos Capitães, na Guiné. Pertenceu à Assembleia do MFA durante o ano de 1975. É investigador de História Contemporânea de Portugal. Publicou, em co-autoria com Aniceto Afonso, os livros Guerra ColonialOs Anos da Guerra Colonial e Portugal e a Grande Guerra. Desde 1983, escreve obras de ficção (incluindo romances, contos, guiões de filmes e séries de TV), sob o pseudónimo Carlos Vale Ferraz.
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