A notícia de que juízes do Porto pediram escusa de intervir num processo ligado aos negócios de futebol e dos seus agentes, que no caso incluíam o presidente do principal clube da cidade, Pinto da Costa e vários dos dirigentes da Sociedade Anónima Desportiva e empresários de jogadores é preocupante e reveladora.
Preocupante porque revela que no Porto existe um poder subterrâneo, marginal e fora da lei. Não existe pleno exercício da soberania naquela comarca. Pelo menos os juízes foram corrompidos por um poder marginal. Se foram corrompidos se se deixaram corromper é outra questão. Se confessam a corrupção ou não, a realidade é que estão corrompidos. Inaptos para a função.
O motivo do pedido de escusa dadas as relações de convívio e amizade com os dirigentes da Sociedade Anónima sob investigação é reveladora do caráter dos juízes em causa e da sua desadequação à função e também ao ambiente de complacência com os princípios que leva estes atos a serem tidos como normais. O juiz, como os todos os magistrados, tem deveres de recato, de prudência. Os magistrados estão (ou devem estar) inibidos de certos comportamentos que ponham em risco a sua imparcialidade e isenção e até a “imagem” que transmite segurança (por isso usam um uniforme nos tribunais e têm direito a tratamento codificado).
O bom senso deveria ser suficiente para os magistrados se absterem de certas convivialidades e atitudes, mas não é. Estes juízes provam que não é. Por terem o dever de recato, de limitação de direitos, os juízes são dos mais bem remunerados funcionários do Estado e têm direitos e privilégios que os distinguem dos cidadãos comuns.
Lembro-me de, enquanto aluno no Colégio Nun’ Alvares em Tomar, ter tido um colega de que apenas recordo o nome de família, Roupiço, de que não mais tive notícias, filho do juiz da comarca. Sei que o pai peregrinava pelo país, estando 4 ou 5 anos em cada localidade, precisamente para não criar afetos locais. Viviam numa modesta casa de função e o pai, o juiz, não frequentava o Café mais conhecido da cidade, por ali se reunirem os advogados.
O juiz Roupiço era o que se designava o herdeiro da figura do juiz de fora, na Europa e desde a Idade Média, um magistrado nomeado pelo Rei para atuar em concelhos onde era necessária a intervenção de um juiz isento e imparcial.
Os juízes do Porto, pertencem à nova categoria do juiz de dentro e a bem da justiça deviam passar à categoria de juízes de fora do sistema judicial, que pagamos caríssimo, em custos diretos e indiretos, entre estes a descredibilização do Estado de Direito. E então, fora do sistema judicial, estes juízes poderiam frequentar os amigos e as amigas que entendessem, assistir a espetáculos e galas para que as empresas os convidassem, sem necessidade de escusas.