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As negras previsões do humor britânico

Apesar da seráfica figura de Carlos, que faz parecer um círio num clarão de fogo-de-artifício, a situação em Inglaterra está a tal ponto após os governos de Cameron, Theresa May, Boris Johnson e agora Liz Truss, que o editorialista do «The Guardian», David Mitchell já escreve: “Talvez devêssemos considerar o regresso à monarquia absoluta!

O humor britânico é um excelente boletim meteorológico para prever tempestades políticas e sociais. Quando os ingleses se riem de si, os outros europeus deviam pensar na tempestade que se aproxima.

Carlos III tomou uma decisão que podia inspirar Marcelo Rebelo de Sousa: Reduziu o seu horário de trabalho em duas horas. A medida motivou o comentário de The Guardian: É como um ator que esperou longos meses pelo papel e cuja primeira pergunta quando chega ao primeiro ensaio é: A que horas é o almoço?

Mas acontece que Sua Majestade quer poupar tempo aos súbditos. Propôs diminuir em duas horas a cerimónia da coroação (Maio 2023) — mais simples e mais barata. Não é apenas a duração do evento que vai ser cortada. Algumas tradições antigas provavelmente serão removidas, por exemplo, o “tribunal de reivindicações” onde se finge que as decisões são tomadas. Também é provável que a apresentação de lingotes de ouro ao novo monarca seja eliminada.

A lista de convidados também será reduzida, dos 8.000 que foram amontoados na Abadia de Westminster da última vez, com a ajuda de enormes pórticos de madeira para uns 2.000 (que, ainda assim, incluirão Marcelo Rebelo de Sousa, estou certo).

Também está a ser pensado refazer o código da vestimenta e dispensar os nobres de usar “roupões” de coroação. Uma pena, pois roupas loucas parecem ser um divertimento importante neste tipo de eventos: todos de uniforme, mas sem uniformidade de uniforme. Uniformes em enorme variedade, esse é um paradoxo do cerimonial real e que se sente adequado às circunstâncias em que a figura de topo de uma economia G7 deve ser apresentada com um símbolo sagrado, coroada com um capacete de metal nobre, antes que todos nos possamos curvar sempre que o Rei entra numa sala.

Obviamente é tudo um pouco bizarro, mas parece relativamente inofensivo e pode ser divertido. A arqueologia viva é interessante. Encurtar a coroação é bom, desde que se mantenham os atores vestidos carnavelisticamente e que se mantenham as regras. Todos devem sentar-se, a menos que devam ficar de pé. Todos devem usar preto, a menos que usem vermelho. Todos devem estar quietos, exceto um homem que grita incrivelmente alto.

O jornal Daily Mail rejeitou a ideia dos ambientalistas de que na coroação de 2023 fossem proibidos os toques de sinos e as sirenes, para não assustar pássaros e outros animais, e orquestrou um inquérito para provar a aprovação do público. Setenta por cento dos entrevistados declararam que “pompa é o que a Grã-Bretanha faz melhor”. Apoiaram os ruídos metálicos. Pode-se argumentar que nenhum país representa a pompa melhor do que a Grã-Bretanha, mas é surpreendente a noção de que a principal reivindicação à excelência deste país que produziu o segundo maior número de vencedores do Nobel se centra na arcaica coreografia militar e religiosa!

Parece ser boa medida encurtar a coroação e perder algumas cenas de que ninguém ouviu falar, desde que ainda seja um grande evento com todos vestidos de forma extravagante. A cerimónia apenas necessita de ser insana e ser apresentada como se fosse a coisa mais surpreendente do mundo!

É sensato da monarquia reconhecer os tempos difíceis e de apertos e não colocar muitos lingotes nas fotografias de Charles III. A economia está a afundar-se, milhões de pessoas estão assustadas, os pobres a ficar mais pobres e o Rei está a demonstrar que se importa com eles, algo que o governo parece surpreendentemente incapaz de fazer.

Isso faz-me suspeitar que a nossa situação (a da Grã Bretanha, mas aplica-se a toda a Europa, e Marcelo Rebelo de Sousa é monárquico) poderia melhorar se restaurássemos a monarquia absoluta. Nas presentes circunstâncias é evidente que a monarquia é mais funcional do que o governo parlamentar.

Na última eleição, o nosso sistema de votação deu ao público uma escolha entre um mentiroso e um socialista e acabamos não sendo governados por nenhum deles. Em vez disso, temos um líder votado apenas por um punhado de membros de direita do clube conservador, que manifestamente não tem a confiança do público.

Democracia e meritocracia são, naturalmente, muito preferíveis à autocracia real, mas a administração de Truss não tem mandato democrático e não demonstra mérito. Carlos III parece ter tanto direito de nos dizer o que fazer quanto ela e dificilmente poderia fazer pior.

Já agora, Ursula Van Der Leyen, Borrel, Charles Mitchel, o secretário da Nato, a presidente do Banco Central Europeu também não têm, tal como Liz Truss, mandato democrático. E não será problema será arranjar um rei para a União Europeia, até temos especialistas em casas reais que vão à televisão e, tal como Carlos de Inglaterra, um Carlos de qualquer ponto da Europa poderia fazer pior do que os atuais ocupantes dos cargos reais de Bruxelas.

Carlos Matos Gomes

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