Há dias grandes. Há dias pequenos de tão grandes. Que dificilmente podem ser pequenos por neles não caberem as coisas que os fazem grandes.
Eu adoro os dias pequenos que são grandes. Fico grande cheia de vida que esses dias me dão. Fico com muitas vidas. Sobretudo quando a vida é vária. Talvez porque vá ao encontro da nossa natureza. Somos múltiplos.
Estes dias grandes são o antídoto da sensaboria. E esta não é boa companhia. Diminui-nos. E amesquinha-nos. Supondo um gesto de reflexão colectivo seria isto que a maioria das pessoas diria da sua vida – um ramerrame.
E quem trabalha vê o trabalho cada vez mais mais extenso. O tempo para mais nada sobra. Venderam-nos a ideia que na Europa os portugueses eram os que menos horas trabalhavam, mais férias tinham e só queriam fazer pontes. E comprámo-la com o dedo acusatório ao vizinho. Com sangue suor e lágrimas. Grande logro.
E temos filhos com dias grandes que esperam pelos pais de dias grandes. Nas creches, nas escolas, em casa, nos computadores, nos telemóveis. E estes dias nunca são pequenos. E quando essa oportunidade acontece, não sabem transformá-los em pequenos. Cada um fixa-se no seu mundito. Ignoram o mundo. Não se conhecem. Não sabem conversar. Não partilham livros. Não riem juntos.
Quem fala em filhos, fala em familiares, amigos. Vivem na sombra de conversas adiadas. Nos filhos, as sombras são maiores. E escurecem-lhes o futuro.
Tivemos horários que eram respeitados. E sonhávamos trabalhar menos e melhor. Sim, porque lá diz a sabedoria popular, trabalhar muito e bem não há quem. Regredimos. Para quê este torpor todo?
Eu cá para mim, estou como Saramago “Contar os dias pelos dedos e encontrar uma mão cheia”.
Ana Freitas
Há dias grandes pequenos e pequenos grandes dias. Há dias cheios de vazio e vazio cheio de dias. Há grãos que crescem no vazio dos dias e outros que choram pelos dias cheios de grão. São os circulos redondos da vida para una,outros, os tais, pressentem-nos apenas. Há dias, horas e vozes, ventos , gritos, choros e tempos. Há vida no trabalho e trabalho na vida. Há tempo e sem tempo. No intervalo há, isso sim, a vontade de acreditar e fazer melhor, sobretudo, para quem, virá depois de nós. O que foi, está, é e será parte do hoje no caminho do amanhã. Construamos, pois, os dias dos grãos cheios.
Gostei, Ana e muito.!
Muito obrigada Maria Teresa Martins Nobre Soares Monteiro pelo seu comentário pertinente.
É sempre um prazer ler as tuas crónicas. Particularmente pela profundidade do que as palavras querem dizer.
Obrigada Ana por partilhares comigo.
Muito obrigada, Palmira Peixoto pelo teu comentário sentido.
Até sempre.
Ana Freitas, a tua escrita é para mim um paradoxo: é ter pressa de chegar à última palavra, e caminhar, devagarinho, dentro de cada frase para sentir o sentido do teu olhar sobre o real destes tempos, ditos novos.
Excelente! Obrigada!
Muito obrigada, Júlia Miguel, pelo teu comentário. Que constitui também um incentivo. Até sempre.