A diretora da Obra Católica Portuguesa de Migrações (OCPM), Eugénia Quaresma, disse hoje que há funcionários da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) em ‘burnout’, considerando que os recursos humanos não estão a ser suficientes.
“Nós sentimos e nós sabemos que os funcionários da AIMA estão, alguns, a entrar em ‘burnout’, portanto, estão mesmo a trabalhar fora de horas”, afirmou Eugénia Quaresma, em conferência de imprensa, no Santuário de Fátima, onde hoje começa a peregrinação internacional de agosto, que integra a peregrinação nacional do migrante e do refugiado.
Esta responsável adiantou que existem “instituições da Igreja que estavam a receber ‘e-mails’ fora de horas”.
A Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais (FNSTFPS) convocou uma greve às horas extraordinárias na AIMA, por falta de recursos humanos.
“O que nos levou a tomar esta decisão foram os problemas que estão a acontecer na AIMA desde a sua entrada em funcionamento, que estão muito ligados à falta de pessoal”, disse hoje à Lusa Artur Cerqueira, dirigente da FNSTFPS.
O pré-aviso de greve tem um prazo entre 22 de agosto e 31 de dezembro.
A diretora da OCPM reiterou que “este tempo de transição [do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras para a AIMA] está a ser aflitivo, apesar de todos os esforços para que as pessoas mantenham a calma e mantenham a serenidade”.
“Mas a verdade é que os recursos não estão a ser suficientes e está a ser repetido por diferentes instituições e esta greve anunciada é mais uma voz a dizer que os recursos não são suficientes e, portanto, é nisto que tem de se trabalhar”, declarou.
Sobre o eventual impacto da alteração legislativa dos critérios de entrada de imigrantes em Portugal, Eugénia Quaresma considerou que “fez sentido parar com as manifestações de interesse, porque estava a haver um uso indevido”.
“Elas foram criadas para responder, em tempo útil, a uma realidade, à necessidade de mão de obra que nós temos em Portugal”, referiu, admitindo ter começado a existir um abuso que criou “um problema ao sistema”.
Eugénia Quaresma realçou, contudo, que, “como alertam muito bem as instituições que estão no terreno”, continua-se com um vazio, questionando como é que se resolve “a questão de quem já está ou de quem tem o processo pendente”.
“A medida ainda não resolve tudo. É preciso, por um lado, dar tempo, por outro lado melhorar as condições e os recursos que estão no terreno, para que possamos responder não só às pendências, mas às pessoas que chegam e vão chegando”, adiantou.
O Plano de Ação para as Migrações, apresentado em junho pelo Governo, inclui o fim do mecanismo de manifestação de interesse, que permitia a um imigrante obter uma autorização de residência.
No mesmo mês, o então presidente da AIMA afirmou que existiam 410 mil processos pendentes de imigrantes em Portugal.
Falando na Comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Luís Goes Pinheiro afirmou que existem 342 mil pendências no capítulo de “manifestações de interesse e processos administrativos de autorização de residências”, a que se somam “70 mil processos que estão em tramitação”.
No total, é um valor máximo de pendências “ligeiramente acima dos 400 mil” pedidos por resolver pelas autoridades portuguesas, afirmou aos deputados Goes Pinheiro.
Na conferência de imprensa, Eugénia Quaresma enumerou ainda as respostas para os desafios que se colocam à Igreja Católica em matéria de migrações, como “reconhecer e vencer o medo”, para fazer face à intolerância e xenofobia.
A promoção do encontro, escutar e ter compaixão, viver a catolicidade, reconhecer os migrantes como uma bênção, cumprir a missão evangelizadora da Igreja, e cooperar com vista à comunhão são os restantes.
No final, assinalou a desinformação que corre nas redes sociais para agradecer “a todos os que estão ao serviço da verdade e que contribuem” para a informação e “para mudar a narrativa relativamente às migrações”.
Migrações: Bispo de Coimbra alerta para retrocesso civilizacional
O bispo de Coimbra, Virgílio Antunes, alertou hoje para um retrocesso civilizacional em matéria de migrações, considerando que este fenómeno exige uma “atitude humanitária”.
“Às vezes, parece que estamos, inclusivamente, num certo retrocesso civilizacional no que a esta questão diz respeito”, afirmou Virgílio Antunes, também vice-presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, no Santuário de Fátima, onde hoje começa a peregrinação internacional de 12 e 13 de agosto a que preside.
Em conferência de imprensa, que antecede o início da peregrinação, na qual se inclui a peregrinação nacional do migrante e refugiado a Fátima, o prelado fez uma contextualização histórica desta matéria, para referir que “sempre houve migrações ao longo da História”.
“Mas no nosso tempo, tem esta circunstância de serem, sobretudo, fruto de uma pobreza agravada e extrema em alguns casos, de serem fruto de regimes totalitários que não permitem às pessoas ser livres, expressar-se e ter acesso às condições normais de vida”, assinalou o bispo de Coimbra.
Acrescem “as questões das perseguições”, sejam religiosas, ideológicas ou políticas, adiantou, para destacar a guerra.
“Eu esperava, talvez todos nós esperássemos, que, no século XXI, algumas destas causas fundamentais que estão na origem destes fenómenos migratórios pudessem estar, em certo sentido, ultrapassadas ou pelo menos atenuadas”, observou Virgílio Antunes, para lamentar que “tem vindo a haver um agravamento das circunstâncias e das motivações e das causas que dão origem a migrações”.
Para o antigo reitor do Santuário de Fátima, “estas causas que a humanidade, por um lado, a que parece dar tanta importância e que, por outro lado, ainda não foi capaz de resolver, nem de encontrar de uma forma razoável, alguns caminhos de solução”.
“Há que ajudarmos o nosso mundo, as nossas sociedades, os nossos políticos, até as nossas chefias religiosas aos mais diversos níveis, procurarmos todos fazer um ‘forcing’ para que algumas destas causas possam ser eliminadas ou pelo menos atenuadas nas suas origens”, defendeu o presidente da peregrinação de agosto.
Face à impossibilidade de isso acontecer de um momento para o outro, Virgílio Antunes apelou ao “sentir comum” da humanidade na perspetiva “de acolher, de integrar, de acompanhar e de ajudar a refazer as vidas de muitas pessoas”, quer daquelas que chegam ao país, quer daquelas que saem.
Referindo que aqueles são verbos que “o Papa Francisco tem utilizado tantíssimas vezes e que repete à saciedade”, o bispo de Coimbra reconheceu, contudo, que “parece que não encontram esses resultados efetivos quando se trata dos Estados, dos governos, da sociedade em geral, dos políticos e até das instituições religiosas procurarem pôr em prática”.
Para Virgílio Antunes, “as migrações são, com certeza, um fenómeno humano”, mas exigem “uma atitude humanitária no melhor sentido desta palavra e deste termo”.
As celebrações oficiais da peregrinação no Santuário de Fátima começam às 21:30, com a recitação do terço, na Capelinha das Aparições, seguindo-se a procissão das velas e a celebração da palavra, no recinto de oração.
Na terça-feira, as cerimónias religiosas iniciam com a procissão eucarística no recinto, às 07:00 e, duas horas depois, o terço, na Capelinha.
A missa, com a bênção dos doentes e a procissão do adeus, encerra a peregrinação, que também é conhecida como peregrinação dos emigrantes.