Sábado, Novembro 2, 2024
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O uso abusivo dos antibióticos: todos nós temos de ajudar a combater o flagelo

Creio que ninguém ignora que a descoberta e o uso dos antibióticos mudaram radicalmente o panorama da saúde pública em todo o mundo, e logo na primeira metade do século XIX. Graças a estas substâncias, recuaram e contiveram-se doenças como a tuberculose, a sífilis e algumas pneumonias; e passou a ser possível travar ou reduzir expressivamente epidemias por infeções bacterianas. Mas deu-se um uso abusivo, o mesmo quer dizer que passou a ser banal recorrer-se à utilização de antibióticos para toda e qualquer situação. A maioria das infeções é provocada por vírus ou bactérias, sendo que o efeito do antibiótico só se verifica em bactérias. Por exemplo, gripes, constipações, sarampo, hepatite, varicela ou papeira são provocadas por vírus, não são tratáveis com antibióticos porque são de origem vírica.

Há muita gente, com a ânsia de resultados quase imediatos, ao mais pequeno sinal da probabilidade de infeção, reclama junto do médico ou do farmacêutico o uso de antibiótico. O que todos temos a obrigação de saber é que o usos incorreto e abusivo dos antibióticos favorece o contacto das diferentes bactérias com múltiplos antibióticos; as bactérias adquirem mecanismos de defesa, sofrem alterações de forma a conviver com os antibióticos, resistindo-lhes – é o que se chama a resistência bacteriana aos antibióticos. Por outras palavras, quando há uma verdadeira infeção bacteriana, o seu controlo é dificultado porque existe a grande probabilidade de a bactéria sobreviver ao contacto com o antibiótico, o que é muito preocupante quanto mais grave for a infeção da doente. Os cientistas pensavam poder disciplinar a resistência aos antibióticos, mas cedo se aperceberam que as bactérias se equiparam com mecanismos de resistência: a bactéria adquire novos genes que lhe dá a capacidade de resistir a certos antibióticos. Há certas infeções que são cada vez mais difíceis de tratar (infeções nosocomiais, urinárias e sexualmente transmissíveis, pneumonias, salmoneloses e infeções ao estafilococo dourado). Em França, as infeções às bactérias multirresistentes estão na origem de mais de 12 mil mortos, anualmente, e estima-se em 700 mil em todo o mundo.

Para combater o flagelo, o doente deve ser responsabilizado para acatar a prescrição médica e atuar em conformidade: só deve iniciar um tratamento com antibiótico após um diagnóstico médico; a constipação e a gripe não devem ser tratadas com antibiótico, estes não produzem qualquer efeito; não se deve insistir junto do farmacêutico para que este dispense um antibiótico sem receita médica; não deve ser considerada como melhor farmácia aquele que vende antibióticos sem receita médica; importa seguir com rigor as recomendações do médico e do farmacêutico sempre que for prescrito um antibiótico; cumprir o tratamento prescrito até ao fim, respeitando o intervalo entre as tomas e a duração; não interromper a terapêutica mesmo que se sinta melhor (o alargamento do intervalo entre as tomas e a suspensão do tratamento, logo que se registam melhoras, são duas das principais causas responsáveis pela resistência bacteriana. Escusado é dizer que o médico prescritor deve avaliar convenientemente as queixas do doente e explicar ao doente e porque é que se seleciona um antibiótico ou o recusa quando é desnecessário ou inadequado; o farmacêutico também tem pesadas responsabilidades: deve sempre recusar a dispensa de antibióticos sem receita e verificar se o doente está devidamente informado, quando é prescrito antibiótico, sobre a duração do tratamento.

Mário Beja Santos

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