A diretora da Obra Católica Portuguesa de Migrações (OCPM), Eugénia Quaresma, criticou os discursos anti-imigração, que fazem do migrante um bode expiatório, e a tendência para hostilizar quem é diferente.
Em declarações à agência Lusa, Eugénia Quaresma referiu-se aos “discursos anti-imigração, os discursos que fazem do migrante um bode expiatório”, para sublinhar que “o problema das migrações não é numérico, é mesmo um problema das vias legais e seguras, um problema de políticas, um problema de coração”.
A responsável da OCPM, organismo da Conferência Episcopal Portuguesa criado em 1962, falava a propósito da peregrinação nacional do migrante e do refugiado ao Santuário de Fátima, integrada na peregrinação internacional aniversária de 12 e 13 de agosto.
Segundo Eugénia Quaresma, há uma dificuldade “em aceitar aquilo que é diferente ou porque tem uma religião diferente ou porque fala uma língua diferente e tem uma cultura diferente e há uma tendência à hostilidade”.
A diretora da OCPM apontou também as dificuldades ao nível da integração e inclusão de migrantes, considerando existir uma “grande necessidade” de “ajudar a desmistificar algumas das coisas da realidade que está a acontecer”.
“Temos comunidades que estão a receber migrantes por conta do trabalho, por conta dos estudantes”, declarou, alertando que “nem sempre existe a promoção do encontro”, pelo que há “necessidade de enfrentar o medo do desconhecido com humanidade”.
Eugénia Quaresma destacou a importância de haver migrantes.
“É importante que nos conheçamos e que reconheçamos a riqueza de ter pessoas de cultura diferente entre nós, não só para a questão laboral, mas também para a questão da nossa sociedade”, afirmou a responsável da Obra Católica, questionando: “Como é que nós podemos ser uma melhor sociedade com a população migrante sem fazer dela um bode expiatório?”.
Para Eugénia Quaresma, há uma grande necessidade “de desmistificar, de mudar a narrativa, de combater os discursos de ódio, de combater a polarização, de combater a violência”, considerando estes desafios na área das migrações para os quais a experiência e papel da Igreja Católica podem ajudar.
Expressando ainda preocupação com a “onda de violência crescente” que se assiste “um pouco por todo o mundo”, a diretora da OCPM apontou as tensões, as guerras e a possibilidade de outras, com consequências para todos.
“Cada vez mais, estamos em contacto com aquilo que se passa no mundo e é fundamental investirmos nas respostas que promovam a humanidade, que promovam a paz, que promovam o encontro, é importante que a diplomacia funcione”, defendeu.
A peregrinação nacional do migrante e do refugiado, sob o tema “Deus caminha com o seu povo”, é o momento mais aguardado da 52.ª Semana Nacional de Migrações, que começa no domingo e termina no dia 18.
O bispo da Diocese de Coimbra e vice-presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, Virgílio Antunes, que foi também reitor do Santuário de Fátima, preside à peregrinação internacional de agosto.
“Transição para a AIMA está a ser aflitiva”
A Obra Católica Portuguesa de Migrações (OCPM) considera que a transição do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) para a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) está a ser aflitiva, defendendo mudanças para benefício de todos.
“Eu sei que a AIMA tem este desejo de melhorar as coisas, a AIMA e também este setor da modernização administrativa, mas, de facto, esta fase de transição está a ser aflitiva e traz mal-estar e, portanto, o que nós queremos é que melhore e melhore depressa para todos”, afirmou à agência Lusa a diretora da Obra Católica, Eugénia Quaresma, no âmbito da Semana Nacional das Migrações.
Questionada sobre as filas de migrantes junto a esta agência, em Lisboa, Eugénia Quaresma declarou que, “infelizmente, não é só à porta da AIMA, é à porta de diferentes serviços”.
“Não é só a população migrante que faz fila para ser atendida, um cidadão português também tem de fazer fila para ser atendido ou para conseguir uma senha num serviço público e, portanto, alguma coisa tem de mudar no atendimento do serviço público”, defendeu Eugénia Quaresma.
Notando que o que se passa com a população migrante “é uma denúncia também a que os portugueses se associam”, esta responsável frisou a “necessidade de mudar alguma coisa no atendimento do serviço público”.
Para a diretora da Obra Católica, há “capacidade para melhorar” e “é preciso melhorar”, sendo que, “melhorando para os portugueses, melhora também para a população migrante”.
Em julho, o Governo criou uma estrutura de missão para resolver os 400 mil processos de legalização de imigrantes pendentes na AIMA, prevendo-se que possam ser recrutados 300 trabalhadores para o efeito.
A responsável da OCPM alertou ainda para as condições em que vivem migrantes, explicando que há uma “tendência à sobrelotação, para fazer face ao preço excessivo das casas”, lamentando haver “pessoas que estão a lucrar com esta necessidade de alojamento”.
“É essencial também acautelar a questão do alojamento, não só para os trabalhadores”, mas também para os estudantes que escolhem o país, preconizou.
Sublinhando a necessidade de “trabalhar bastante em rede”, nos países de origem, trânsito e destino de migrantes, “para que as migrações não sejam um bicho de sete cabeças”, Eugénia Quaresma ressalvou que o maior número de migrantes “chega pela via legal”, pelo que se deve “articular melhor as questões da inclusão” e “prevenir, o mais possível, a questão das redes [de tráfico de pessoas] e daqueles negócios que surgem em torno da morosidade quando o sistema não funciona”.
“Há sempre oportunistas à procura de fazer negócio, e há nacionais e não nacionais a fazer negócio em torno das migrações. É isso que temos de acautelar, garantindo que o sistema funciona, que as vias legais e seguras funcionam, no acolhimento, na promoção e na integração e inclusão da população migrante”, acrescentou.
A 52.ª Semana Nacional das Migrações começa no domingo e termina no dia 18. Inclui a peregrinação do migrante e do refugiado ao Santuário de Fátima, integrada na peregrinação internacional de 12 e 13 de agosto.
Esta semana é aproveitada para dar a conhecer o que a Igreja Católica faz na área das migrações.
“A Igreja tem uma História mais do que centenária no acompanhamento da população migrante, a própria Igreja tem uma origem migrante e, por isso, tem uma experiência que ajuda a humanidade a ser mais humana”, declarou Eugénia Quaresma, adiantando que gostaria que se olhasse para o “lado positivo do migrante, para o potencial evangelizador do migrante”.