A Federação Nacional dos Médicos (FNAM) lançou esta segunda-feira, 28 de outubro, um duro comunicado contra o Governo de Luís Montenegro e a Ministra da Saúde, Ana Paula Martins, acusando o executivo de ocultar diplomas com impacto direto no funcionamento do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e de avançar com medidas que considera ilegais, economicistas e lesivas dos direitos dos médicos e das populações.
Entre as propostas em causa, a FNAM destaca dois diplomas — a criação de Serviços Centralizados de Urgência Externa de âmbito regional e a implementação dos Centros de Elevado Desempenho (CED) em Obstetrícia e Ginecologia — que, segundo a federação, não foram objeto de uma negociação transparente e colocam em risco a qualidade dos cuidados de saúde públicos.
“Urgências regionais”: modelo ilegal e inconstitucional, diz FNAM
A estrutura sindical contesta a criação dos chamados “Serviços Centralizados de Urgência Externa de Âmbito Regional”, que considera juridicamente inexistentes e sem suporte constitucional. A FNAM afirma que não existe nenhuma entidade “regional” com competências em saúde no ordenamento jurídico português, tornando o diploma ilegal e violador do artigo 255.º da Constituição da República.
Para a federação, esta medida traduz-se na mobilidade forçada de médicos, com deslocações permanentes tratadas como inerentes à função, em violação dos Acordos Coletivos de Trabalho. A FNAM critica ainda a Ministra Ana Paula Martins por ter equiparado o trabalho em urgência a “ir a um congresso”, o que considera revelador de “desconhecimento da realidade clínica”.
A federação teme que o novo modelo leve ao encerramento de urgências obstétricas e ginecológicas, sobretudo no interior do país, com consequências diretas na desertificação dos territórios e na segurança de grávidas e bebés.
Centros de Elevado Desempenho: “SNS a duas velocidades”
Quanto aos CED, a FNAM denuncia um modelo que, no seu entender, promove a mercantilização da prática médica e incentiva a competição em detrimento da qualidade assistencial. O sistema de incentivos previsto assenta 60% na produtividade e apenas 40% na qualidade, o que, segundo a federação, transforma o trabalho médico numa “contabilidade de horas”.
A possibilidade de majoração de remunerações até 50%, sem critérios uniformes entre unidades locais de saúde, poderá gerar desigualdade entre colegas, fragilizar a formação médica especializada e criar “mini-SNS” dentro do SNS, comprometendo a coesão do sistema público.
Acusações de má-fé negocial
A FNAM acusa o Ministério da Saúde de não ter fornecido os textos completos dos diplomas, limitando-se a resumos e excertos, impedindo uma análise técnica e jurídica aprofundada. O envio da documentação foi feito na noite de 20 de outubro, às 23h30, três dias antes de uma reunião negocial marcada para 24 de outubro — precisamente o mesmo dia da greve dos médicos e da Administração Pública.
A federação denuncia ainda que, mesmo na reunião supletiva de 28 de outubro, os documentos continuam incompletos. Por isso, considera que o Governo atua com “má-fé negocial total” e em desrespeito pelo dever constitucional de diálogo e transparência.
FNAM exige suspensão imediata das medidas
A FNAM exige:
- A divulgação integral dos diplomas em discussão;
- A suspensão imediata da sua aplicação até à conclusão de uma negociação efetiva;
- O respeito pelos princípios constitucionais e laborais que regem o SNS.
No entender da estrutura sindical, as propostas do Governo fragilizam o SNS, desrespeitam os médicos e “traem o direito das populações a uma saúde pública de proximidade”.
“O SNS não precisa de diplomas secretos nem de propaganda. Precisa de médicos respeitados, equipas estáveis e investimento sério”, conclui a FNAM.














