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Todos os Santos e Halloween

Primeiro de novembro, Dia de Todos os Santos, bandos de miúdos pediam, de porta em porta, o Pão por Deus. Lengalengas ecoavam: Lá vai o meu coração, todo cheio de carinho, vai pedir o Pão por Deus, de quem encontrar no caminho.

Ciclo festivo anual, religioso e mágico, apazigua a dureza do dia-a-dia, renova a tradição, restabelece os rituais e perpetua-os. Considerado o Ano Novo pelos Celtas, em que o sol encolhe e tratadas estão as colheitas.

Na noite mais sagrada, as fogueiras iluminam a noite e os espíritos como que voltam ao seu lugar terrestre, purificados que estão. Esta crença afasta os espíritos do mal, são dádivas para os menos afortunados, e leva aos rituais dos mitos.

Foi o encontro do paganismo com a cristandade e o resultado, longe de findar, transforma-se e mantém-se. Isto nos vem do Séc. VIII, instituído pelo Papa Gregório II, uma plasticidade das tradições, que leva aos rituais do dia dos mortos. Esta, uma das muitas teorias que, nos nossos dias, justificam o processo.

Então, temos que, com o avanço do cristianismo, a Igreja Católica tentou substituir na Europa o festival pagão, instituindo o Dia de Todos os Santos (All Hallows`Day) no 1.º de novembro. Daí, a véspera da data ser chamada de All Hallows`Eve, expressão na origem da palavra Halloween. Eis a tal plasticidade, uma colagem pagã à religiosidade conveniente.

Halloween, a noite de bruxas e duendes, em véspera dos santinhos alumiados pela luz do dia!

Há quem ateste que o Pão por Deus não terá raiz cristã, por haver chegado com o culto dos mortos, em que se depositavam alimentos junto aos túmulos. Já outros assentam que a tradição oral o explica pela necessidade que os pobres tiveram de arranjar sustento após o terramoto de 1755, precisamente o Dia de Todos os Santos. Fugidos de Lisboa, apavorados, arrastando-se esfaimados, rogavam por comida aos portões das quintas: Pão por Deus imploravam evocando o divino!

Nos dias que correm estas sobrevivências culturais retomam o ciclo: Pão por Deus, Pão por Deus, saco cheio, vamos lá com Deus, e a garotada calcorreia ruas e ruelas, em que as dádivas sempre chegam: romãs, castanhas, nozes, broas, umas moedas, uns chocolates.

A terminar, esta prática da tradição das oferendas pode ser interpretada como a paga à divindade, tratando-se de comunidades agrárias, pela ajuda às boas colheitas. No fundo, esbatidas no tempo, estas promessas coletivamente propostas e aceites na comunidade, são compromissos onde se misturam o sagrado e o profano, o religioso e o pagão. Eis os tempos em que vivemos!

Arnaldo Vasques

Antropólogo / Mestre em Temas Contemporâneos / FCSH – NOVA, Lx.

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