InícioOpiniãoA dor invisível - Quando o corpo fala e ninguém escuta

A dor invisível – Quando o corpo fala e ninguém escuta

Em Portugal, a endometriose continua a ser uma doença invisível. Invisível para quem não a sente, invisível para muitos dos decisores políticos e muitas vezes invisível até para quem a vive, porque demora anos a encontrar um nome para a dor que carrega.

O mais recente estudo nacional, promovido pela campanha “A Minha Dor Não Me Define”, veio confirmar o que as mulheres com endometriose dizem há vários anos: a dor não é normal — e o silêncio em torno dela tem consequências, muitas vezes graves. Segundo os dados, um terço dos homens inquiridos nunca ouviu falar da doença, e apenas 30% sabem descrever o que é. Mesmo entre as mulheres, o desconhecimento continua a ser preocupante: duas em cada dez não recebem qualquer informação médica sobre a endometriose.

Por trás destes números há vidas e sonhos adiados. Há quem falte ao trabalho mais de uma dezena de vezes por ano. Há quem viva com dor incapacitante semanal, ansiedade, tristeza e frustração. Há relações afetadas, planos de maternidade suspensos, carreiras interrompidas. Tudo isto porque o corpo insiste em dar sinais que ninguém aprendeu a escutar e que continuam a ser desvalorizados.

A endometriose não é apenas uma doença ginecológica, é uma doença que afeta todo o corpo com consequências físicas e emocionais graves — é uma questão de saúde pública, de igualdade e de dignidade. Não podemos continuar a normalizar o sofrimento feminino e é emergente que se encontrem respostas eficazes para um diagnóstico precoce e um acompanhamento e tratamento célere e eficaz. O estudo mostra que 70% das mulheres com endometriose, que participaram do mesmo, vivem episódios frequentes de ansiedade e tristeza. Esta é uma doença que atinge o corpo e consequentemente a mente, da mesma forma que impacta a vida pessoal, familiar, laboral e social.

Imagem Depositphotos

É urgente falar mais, diagnosticar melhor e apoiar verdadeiramente. Isso implica formação médica contínua, mais acesso a consultas especializadas, acesso a exames conclusivos e a cirurgias multidisciplinares em tempo útil, assim como políticas públicas que reconheçam o impacto real da endometriose na vida das pacientes. E implica também um compromisso da comunicação social, que 95% dos inquiridos reconhecem como essencial para quebrar o silêncio.

Na MulherEndo, ouvimos todos os dias histórias de dor, mas também de força e superação. Mulheres que, apesar de tudo, se reinventam, encontram apoio e recusam ser definidas pela doença. É por elas — e por todas as que ainda esperam um diagnóstico — que precisamos de continuar a dar visibilidade à endometriose.

Esta dor invisível só deixará de o ser quando o país inteiro a reconhecer.

Susana Fonseca

Presidente da Associação MulherEndo

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